Observações Iniciais:
A - Minha
ideia original, como indiquei na 2ª parte deste artigo, era tratar, diretamente,
da Ilegalidade das Comissões Judicativas das TJ nesta 3ª parte, porém, notei
que as figuras jurídicas que ainda preciso esclarecer, a fim de conseguir me
fazer me entender para os(as) leitores(as) que forem da área jurídica, têm um
volume de texto (mesmo eu buscando reduzi-lo ao máximo) bem maior do que eu pensava,
assim, resolvi tratar apenas de tais figuras jurídicas nesta parte e deixar a
análise da Comissões para a 4ª parte deste artigo.
B - Além
disso, quando afirmo no título desta 3ª parte que tratarei de “Figuras Jurídicas que você precisa conhecer” isso vai para além dos objetivos deste artigo,
viso prover algumas noções de cidadania que todo o cidadão, na verdade, precisa
e deveria ter.
C - Não
sendo o Direito uma Ciência exata, o que apresento abaixo tem a ver com o meu ponto
de vista (que, como todo o ponto de vista, nada mais é do que a vista, vista de
um ponto), isso é, as razões que me levam a concluir aquilo que vou afirmar
abaixo tem a ver com a percepção que formei ao longo do tempo em que estudo, milito e lesiono na área jurídica. Tais
conclusões não precisam convencer a todo mundo mas, enquanto convencerem pelo
menos a mim, serão o meu ponto de vista.
D - Como
sempre ocorre em meus artigos, vou convidar os(as) leitores(as) a expressarem seus
pontos de vista e, se eles forem contrários aos meus, não há qualquer problema
nisso, pois, inclusive, posso avaliar um ponto de vista contrário e acabar o
adotando afinal - Certificai-vos (ITs.5:21)!
Feito este necessário introito, passo à 3ª parte deste artigo.
1ª Figura - TRIBUNAL DE EXCEÇÃO
Uma forma muito propícia introduzir a
ideia do que vem a ser e de qual o objetivo de se estabelecer Tribunais de
Exceção, pode ser percebida pela leitura do Preâmbulo da Constituição Federal
de 1937, elaborada na época do chamado “Estado Novo” quando estava no poder
Getúlio Vargas. Ali lemos:
Obs – Vou me permitir um
pequeno comentário aqui: considerando o momento atual que vivemos no Brasil, momento
no qual capitalistas notórios e “selvagens” têm sido taxados de comunistas, o
mesmo “perigo” denunciado no Preâmbulo da Constituição/37, tem sido afirmado,
está de volta ao cenário e, mais uma vez, é possível que se pretenda utilizar
dos mesmos e “amargos” “remédios”!
Voltando ao tema, o trecho do Preâmbulo da CF
transcrito acima faz pressupor quais (amargos) “remédios” (radicais e
permanentes) poderiam ser “ministrados”, sendo o chamado “Tribunal de Exceção”
(como ficará claro abaixo) certamente, um deles (a fim de sempre conseguir a
condenação do inimigo).
Dentro
da definição mais clássica, “Tribunais de Exceção” seriam organismos
“julgadores”, criados após os fatos que irão “julgar” no objetivo, único
e exclusivo, de condenar os acusados.
Uma outra forma de se estabelecer um Tribunal de
Exceção se dá quando o julgador ou julgadores são parciais, assim, mesmo que o
organismo julgador não tenha sido criado, especialmente, para “julgar” fatos
que precedem sua existência, se a condenação de quem for “julgado” ali já está
dada, o “julgamento” ocorrerá, da mesma forma, em um Tribunal de Exceção.
A vinculação entre estas duas formas de “Tribunal de
Exceção” é tão evidente que nossa atual Constituição proíbe a ambas, como
exponho abaixo.
Os textos jurídicos que tratam dos Tribunais de
Exceção, defendem que dele tratam entre dois e três dispositivos da
Constituição atual (que é de 1988) e nestes vemos a proibição dos Tribunais de
Exceção nas duas formas indicadas acima.
Tais dispositivos constituem direitos fundamentais do
cidadão (direitos chamados de “cláusulas pétreas” – garantias fundamentais que
só podem ser revogadas se uma nova Constituição for elaborada).
O primeiro destes dispositivos está no inciso XXXVII
do Art. 5º que, de forma clara e direta, afirma:
não haverá juízo ou tribunal de exceção;
Como afirmei, de nada adiantaria a Constituição
proibir os Tribunais de Exceção (no sentido clássico do termo) se os julgadores
não forem isentos ao julgar e é exatamente em função disso que a proibição ao
“julgamento de exceção” necessita de outros pontos de apoio para que possa ser
efetiva e tais pontos de apoio estão em, pelo menos, mais duas “cláusulas
pétreas”, os incisos LIII e LIV, do mesmo Art. 5º, segundo os quais
(respectivamente):
senão pela autoridade competente;
e
ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Só assim não estará o acusado em um “Tribunal de
Exceção” em todos seus sentidos.
Dada uma noção (ampliada) do que vem a ser um
“tribunal de exceção” cabe aprofundar algumas outras figuras jurídicas
pertinentes aos objetivos desta parte do artigo e que também decorrem dos dispositivos
constitucionais já citados.
Aqui
inicio citando trecho de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que trata
do Princípio acima:
“(...) Tão antigo como antiga é a própria legislação –
não há falar em jurisdição sem falar em juiz natural - , o princípio do
juiz natural tem, ao fim e ao cabo, a finalidade de resguardar a
legitimidade, a imparcialidade e a legalidade da jurisdição.” (STJ. AgReg
no HC 106590/SP. Rel. Min. Nilson Naves. Sexta Turma. J. 05.05.2009. Dje
01.06.2009)
Ao preferir um julgamento (seja ele de condenação ou
não) um juiz precisa ser “natural”, isso é, precisa munir cada decisão que
proferir de legitimidade, imparcialidade
e legalidade.
Sobre o "Juiz Natural" também importante trazer a seguinte noção:
Trata-se, portanto, de
um juiz previamente encarregado, na forma da lei, como competente para o
julgamento de determinada lide, o que impede, entre outras coisas, o abuso de poder.
Como consequência, não se admite a escolha específica nem a exclusão de um
magistrado de determinado caso.
https://www.cnj.jus.br/cnj-servico-principio-do-juiz-natural/
Assim, o juiz natural é aquele previamente designado, que toma conhecimento dos fatos de acordo com o que consta do processo e julga, com isenção de ânimo, de acordo com as "ferramentas" que o Direito coloca a disposição.
Um julgamento meramente protocolar ou, como se diz no
mundo futebolístico, um julgamento para –
cumprir tabela – é absolutamente ilegal e impor uma pena proveniente de
um julgamento ilegal é tão ou mais reprovável que o fato, o crime que se julgou
(por mais que aquele que foi assim julgado, realmente, mereça a pena imposta)!
Visto isso necessário oferecer, ainda, mais duas figuras jurídicas.
Como vimos, a Constituição garante aos
acusados em geral um “devido processo legal”.
A lei não específica (e nem poderia especificar), o
vem a ser o “devido processo legal”, até porque, além de garantias gerais, que
devem estar presentes em todos os julgamentos, cada caso concreto pode
apresentar uma ou mais particularidades em razão das quais, garantir o devido
processo legal, significará adotar uma ou mais providências que outros casos
dispensam.
Dentre as garantias gerais, que todos os julgamentos
têm que apresentar, se encontra o “sagrado” direito de se defender, por todos
os meios lícitos, daquilo que se foi acusado (caso se proíba o acusado de
produzir provas de uma ou mais de suas alegação defensivas e, ao final, o
julgamento lhe for adverso, exatamente, em razão do julgador concluir que o
acusado não conseguiu provar suas alegações, tal (odioso) julgamento infringe,
em todos os sentidos, o Princípio do Devido Processo Legal, pois, tal
julgamento terá se dado em um “Tribunal de Exceção”!
-
É por esta razão que a Constituição, no inciso LV (também do Art. 5º)
determina:
Qualquer
julgamento que não garanta ao acusado a possibilidade de contraditório e de
AMPLA defesa é absolutamente nulo.
Obs – Sobre
isso, necessário notar que o legislador constitucional não se contentou em
garantir (mero) direito de defesa, mas sim, exigiu que tal direito seja AMPLO,
o que se garante, como afirma a parte final do dispositivo acima, por todos “...os
meios e recursos a ela inerentes”.
LV - aos litigantes, em processo judicial OU ADMINISTRATIVO, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes;
Existe um entendimento segundo o qual as chamadas “garantias
constitucionais do processo” valem apenas para processos judiciais e
administrativos sendo estes entendidos, exclusivamente, como processos que
tramitam perante a Administração Pública (leia-se, perante o Poder Executivo da
União, dos Estados e dos Municípios ou do Distrito Federal), como ocorre quando,
por exemplo, se recorre de uma multa de trânsito ou se busca obter o
“habite-se” em uma nova construção residencial.
Estas limitação, porém, fere a real interpretação que
os direitos fundamentais devem receber, pois, tais direitos, para serem realmente
eficazes precisam abranger o máximo de situações possíveis, assim:
- As garantias constitucionais do processo (todas
elas) devem ser observadas em todos os processos (formalizado ou não
formalizado) que, “no final das contas”, possam resultar em penalização, assim,
entendo como “processo administrativo” todo o processo que não for judicial,
seja perante a administração pública ou não.
- O trecho que sublinhei acima (aos acusados em
geral) também não pode ser aplicado de forma restritiva, afinal, a
expressão: “acusados em geral” já traz em si a ideia de que se está
fazendo referência a todos que forem acusados de qualquer coisa que possa, “no
final das contas” resultar em uma punição e não apenas as pessoas mencionadas,
como tendo praticado algo ilegal, seja em inquéritos civis (promovidos pelo
Ministério Público) ou em registros ou inquéritos policiais.
A razão principal que me convence de que os termos “administrativo”
e “acusados em geral”, usados no inc. LV transcrito, devem receber
interpretação ampliativa, está no fato de que isso visa garantir direitos
reconhecidos como FUNDAMENTAIS em situação que impliquem em julgamento e
aplicação de pena, logo, negar a qualquer pessoa que esteja em tal condição as
garantias fundamentais do processo significa privá-la do FUNDAMENTAL!
Um exemplo de interpretação ampliativa dos direitos
fundamentais (exatamente relacionado a julgamento e aplicação de pena) provêm
do Supremo Tribunal Federal (corte máxima de justiça do pais, chamado de –
Guardião Da Constituição – exatamente, porque a ele compete decidir, em
definitivo, questões relacionadas ao texto constitucional), tem a ver com a
aplicabilidade das normas fundamentais a estrangeiros que não residam no pais
mas aqui se encontrem. Segundo o caput do Art. 5º da Constituição:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
Como se vê, no que depender do texto constitucional em
si, estrangeiros não residentes no país não contam com nenhum dos direitos e
garantias fundamentais previstos na Constituição, quando estiverem em
território nacional!
Mas notem como o STF (reconhecendo que aquilo que é
fundamental, não pode faltar), tem se manifestado sobre o tema:
“'HABEAS CORPUS' (...)
ESTRANGEIRO NÃO DOMICILIADO NO BRASIL - IRRELEVÂNCIA - CONDIÇÃO JURÍDICA QUE
NÃO O DESQUALIFICA COMO SUJEITO DE DIREITOS E TITULAR DE GARANTIAS
CONSTITUCIONAIS E LEGAIS (...). O SÚDITO ESTRANGEIRO, MESMO AQUELE SEM
DOMICÍLIO NO BRASIL, TEM DIREITO A TODAS AS PRERROGATIVAS BÁSICAS QUE LHE
ASSEGUREM A PRESERVAÇÃO DO "STATUS LIBERTATIS" E A OBSERVÂNCIA, PELO
PODER PÚBLICO, DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS".
- (...) - Impõe-se, ao
Judiciário, o dever de assegurar, mesmo ao réu estrangeiro sem domicílio no
Brasil, os direitos básicos que resultam do postulado do devido processo
legal, notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla
defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz
natural e à garantia de imparcialidade do magistrado processante.”
HC 94.016/SP, 2ª Turma, Relator Ministro - Celso de Mello, DJe de 16.09.2008
Além disso, a doutrina jurídica constitucional defende
que os direitos fundamentais têm o chamado “eficácia irradiante”, isso é, devem
se espalhar em máxima amplitude e em todas as direções, a fim de abrangerem todas
as situações possíveis. Neste sentido, o eminente professor/doutor Walter C.
Rothemburg afirma:
“A interpretação dos direitos fundamentais deve ser ampliativa, buscando a leitura mais favorável que deles se possa fazer. Essa propriedade também é dita eficácia irradiante dos direitos fundamentais” (Direitos Fundamentais e suas Características – Revista dos Tribunais, n. 29, out.-dez. 1999)
Conclusão: Eram estas as figuras jurídicas que, em conjunto com aquelas vistas na duas partes anteriores deste artigo, permitirão que me faça entender, quando expressar, na próxima parte deste artigo, as razões que me convencem que as Comissões Judicativas que atuam entre as TJ são totalmente ilegais (são verdadeiros Tribunais de Exceção)!
Mas, além delas auxiliarem na próxima parte deste artigo, elas também são uma pequena amostra de noções de Direito que todo cidadão deveria ter e agora, você que leu o texto acima, as têm.
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Quer
concordar ou discordar? Quer acrescer algum detalhe favorável o que escrevi
acima ou tem muitas objeções a fazer? Encontrou algum erro de escrita que
necessita de urgente correção? Escreva para mim (pelo e-mail:
1Tessalonicenses5:21@gmail.com ou deixe uma mensagem no Blog). Desde já,
agradeço!
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